Vigilância Locativa

Vigilância Locativa

Sistemas de localização podem ser usados para criar novos sentidos dos lugares, apropriação do espaço urbano, formas de escrita e releitura das cidades, mas também como ferramentas de controle, monitoramento e vigilância. É o caso das etiquetas RFID, dos sistemas de rastreamento por GPS, das redes bluetooth…Efetivamente a sociedade de controle está em expansão aliando mobilidade, liberdade informacional e criação voluntária de perfis .

No Brasil, sistema de monitoramento de automóveis é pensado como “default” para resolver aquilo que os instrumentos e instituições de segurança pública não resolvem: a segurança dos cidadãos. Agora o governo quer, pelo viés meramente tecnocrático, resolver o problema obrigando todos os carros a sairem de fábrica com monitoramento eletrônico embarcado. Post do Mídia Locativa informa sobre a resolução 245 do Contran (Conselho Nacional de Trânsito) e sobre as portarias 47 e 102 do Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) que tornam obrigatória a implantação de sistemas de monitoramento e antifurto nos veículos brasileiros a partir de 2010. Vejam a íntegra no post a partir da matéria da revista jurídica online Última Instância publicada nesta segunda, 23 de Março. Trecho da matéria:

“O Ministério Público Federal entrou com uma ação para proibir que veículos novos saiam da fábrica com sistema de monitoramento e antifurto instalado. Para a Procuradoria, a medida, que entraria em vigor em 2010, pode fazer com que as pessoas fiquem monitoradas 24 horas por dia. Montadoras consultadas pelo MPF afirmaram que os equipamentos de antifurto e rastreamento podem ser monitorados, independentemente da autorização do proprietário. (…) “


Abaixo reproduzo trechos que escrevi no artigo “Mídias Locativas e Vigilância. Sujeito Inseguro, Bolhas Digitais, Paredes Virtuais e Territórios Informacionais”, apresentado em Curitba em evento sobre vigilância este mês. Em breve coloco o texto na íntegra para download aqui no Carnet.

“As mídias locativas podem ser, efetivamente, ferramentas de invasão da privacidade e de violação do anonimato para fins comerciais, militares, políticos ou policiais. O novo regime “invisível” dos banco de dados, de localização e cruzamento de informações, de monitoramento de perfis de consumo e dos movimentos pelo espaço urbano crescem na mesma medida que a liberdade de locomoção e de acesso/distribuição de informação. Não é por acaso que esses serviços e tecnologias surgem de pesquisas militares, prolongando a vigilância estatal, policial, comercial e industrial desde o século XVIII. Empresas e governos têm utilizado essas tecnologias para a coleta de dados pessoais nem sempre realizada com o conhecimento ou o consentimento do cidadão . Para uma ação efetiva que proteja os indivíduos de sistemas de vigilância (estatais, militares, comerciais) que possam violar seus direitos, é necessário o reconhecimento dos novos territórios informacionais. “

(…)

“Vigiando (controlando e monitorando) as mídias locativas ameaçam a vida privada e o anonimato. A privacidade pode ser definida como o controle e a posse de informações pessoais, bem como o uso que se faz posteriormente delas. Anonimato, por sua vez, implica na ausência de informação sobre um indivíduo e também ao controle sobre a coleta de informações pessoais (Gow, 2005). A privacidade é um pilar das sociedades democráticas já que ‘empowers people to control information about themselves; protects people against unwanted nuisances, or the right to be left alone; (…) is related to dignity in the reciprocal obligations of disclosure between parties; (…) is also a regulating agent in the sense that it can be used to balance and check the power of those capable of collecting data’ (Lessig, apud Gow, 2005, p. 7). Embora correlatos, privacidade e anonimato sofrem impactos diferenciados pela ação das tecnologias locativas . Estas podem coletar dados pessoais e difundir outros já gerados sem o consentimento ou mesmo o conhecimento do usuário em ações de fiscalização (controle), acompanhamento e avaliação (monitoramento) e prevenção e zelo (vigilância). Indivíduos podem perder o controle sobre a geração de dados e a circulação dos existentes. Eles são, então, constrangidos respectivamente em seu anonimato ou privacidade. “

(…)

“A sociedade do controle está em toda parte. Para além do panopticom que vigia o confinado, as atuais câmeras de vigilância, cartões com chips, perfis na internet, GPS e sensores, controlam o sujeito ‘inseguro’ em sua mobilidade cada vez maior. Mobilidade é mesmo a palavra chave para pensar as massas (império?), o uso da informação (vivendo sem fronteiras?) e as possibilidades de localização e reconhecimentos de coisas no espaço. Mais movimento significa também maior possibilidade de controle, vigilância e monitoramento de pessoas, informações e objetos. As mídias locativas, onde localização e mobilidade significam possibilidades de produção de sentido no espaço e nos lugares, são também instrumentos de controle, monitoramento e vigilância de lugares, espaços e indivíduos, agora enredados em bancos de dados moduláveis, sensores ubíquos e onipresentes, redes sem fio fluídas e inteligentes, dispositivos de localização “atentos às coisas”. Não esqueçamos que essas tecnologias têm origem militar. Toda mídia locativa, por seu caráter intrínseco associando mobilidade e localização, pode ser usada para monitorar movimentos, vigiar pessoas e controlar ações no dia a dia.”

(…)

“Exemplos de violação da privacidade podem ser encontrados em experiências com o uso das etiquetas de radiofreqüência, RFID, comumente chamadas de “spychips”. Albrecht e McIntyre (2006) oferecem inúmeros casos de uso de RFID com violação de privacidade com fins policiais, políticos ou comerciais. Essas micro-etiquetas estão disseminando-se em todos os lugares (roupas, placas de carros, produtos, passaportes) e têm como objetivo melhorar a eficiência e segurança de empresas e governos já que servem para monitorar produtos e pessoas, aliando mobilidade física e informacional. Segundo as autoras, ‘in a future world laced with RFID spychips, cards in your wallet could ‘squeal’ on you as you enter malls, retail outlets, and grocery stores, announcing your presence and value to businesses. Reader devices hidden in the doors, walls, displays, and floors could frisk the RFID chips in your clothes and other items on your person to determine your age, sex, and preferences. Since spychip information travels through clothing, they could even get a peek at the color and size of your underwear’ (Albrecht e McIntyre, 2006, p. 3)”