Nunca quis ser jogador de futebol

Nunca quis ser jogador de futebol, mas quase me tornei um. Desde os 10 anos ou antes, o futebol era meu esporte e minha paixão. Vivia o futebol, pensava em futebol, seguia o futebol. Isso é culpa do meu pai, da copa de 1970, como mostrei em outro post.

Lembro de jogar bola todas as tarde, depois da aula no Colégio Zaccarias, na praia do Flamengo com meus amigos (Gol a gol, chutes e defesas, e jogos mesmo, na areia fofa). Jogava bem na linha e era também um excelente goleiro. Adora voar e me guiava por uma entrevista que li no jornal com o goleiro Felix que dizia que o único segredo era olhar para a bola e ir atrás dela. Aceitei e fazia isso, e pegava muito. Joguei em praias, clubes, no asfalto (em Irajá, na rua onde moravam meus primos Pedrinho e Antoninho – que tempo maravilhoso – e lembro que no verão jogávamos água no asfalto que enfumaçava imediatamente – o calor era tanto que dava para fritar um ovo), jogava na grama do parque do flamengo, na terra batida dos campos do aterro e mesmo e espaço cimentados. Todo espaço era bom e qualquer bola servia (de plástico, de couro, de meia – joguei muito bola de meia no playground do prédio onde morava na Vitória, em Salvador – e até fruta pão, no colégio Antônio Vieira. Lembro quando comprei uma vez, ainda no Rio, uma bola oficial e levei todo contente para o aterro para jogar com meus amigos e conhecidos da “pelada” (nome no Rio e “baba”, na Bahia). No primeiro chute na bola, a infeliz caiu em uma vala e sumiu para sempre….

O período do Rio é de 1962 (quando nasci) a 1975 quando mudamos para Salvador. Depois voltei a morar no Rio em 1986 e 1987 (quando abandonei o futebol) e depois voltei a jogar no calor, no frio e na neve (pela primeira vez) de 1991 à 1995 em Paris, nos fins de semana (com colegas do doutorado: franceses, Olivier, Bertrand, italianos, os irmãos Federico e Stefano, o coreano Young, o japonês Riozo e os brasileiros, principalmente o meu amigo Juremir Machado da Silva). Quanto voltei ao Brasil, tentei jogar ainda no “Albinão”, com colegas da Faculdade (Jeder, Palacios, Elias, Othon, Albino…), mas foi a última vez. Meu joelho não me permite mais a prática deste esporte.

Não só adorava jogar como era um expert no assunto: conhecia os jogadores dos principais times, entendia das táticas e estratégias de jogo dos técnicos mais importantes, e era muito informado sobre os resultados nacionais dos campeonatos regionais (Rio e São Paulo, e depois Bahia, mas nunca me interessei muito pelo fraco campeonato baiano) e nacional. Comprava sempre, depois dos jogos, o rosa “Jornal dos Sports”, ainda no Rio, e também quando me mudei para Salvador. Pedia ao jornaleiro da minha rua para guardar o meu exemplar, deixa pago principalmente depois dos jogos do Fluminense. Não pudim perder os detalhes do jogo já que não estava mais no Rio e a TV não mostrava (só os Gols do Fantástico ou o Globo Esporte). O jornal rosa trazia fotos em sequência dos gols e das jogadas importantes. Cheguei a criar um álbum com estas fotos dos jogos do Fluminense mas não sei onde está. Se encontrar, mostro aqui. Olhar a sequência de fotos era como ver o replay dos gols. Ainda no Rio, cheguei a ser chamado para treinar no infanto-juvenil do Fluminense, na época da máquina. Joguei no clube, entrando de penetra e fui chamado. Lembro que no primeiro dia do treino tive uma febre emocional que não me deixou sair de casa. A ida a Salvador, me tirou do clube. Jogava por paixão e nunca houve um pensamento, nem meu, nem dos meus pais (a favor ou contra), sobre ser jogador profissional. Nunca pensei seriamente nisso.

Ouvia os jogos do Fluminense em Salvador pela Rádio Globo e era fã de Jorge Curi, Valdir Amaral (com os bordões : na chamada “Valdiiiiiiiiir Amaral”. Ele respondia “Deixa comigo”, ou no gol: ”9, é a camisa dele, indivíduo competente…”, ou tempo do jogo: ”o relógio marca…”) e Mario Vianna que analisava a arbitragem (“goooll leeegal”, “eeeeeeeerrrroooooouuu!”). Ouvia no Rio, e também em Salvador, com o radinho de pilha colado ao ouvido, como na decisão contra o Botafogo em 1971 (gol polêmico de Lula), no Rio, em casa, e em inúmeras vezes na Bahia. Tinha que achar um lugar bom para conseguir pegar a transmissão da rádio Globo em Salvador (a noite era mais fácil) e ouvir os jogos do Fluzão. Não havia canais a cabo e as informações sobre o futebol mundial só em época das copas ou decisões de clubes importantes.

Jogava bem e em muitas posições, mas onde era melhor mesmo era como meia atacante, centroavante e goleiro. Acabei optando por ser centroavante e jogava assim os campeonatos no colégio Antônio Vieira e nos clubes Baiano de Tênis, onde em um ano na década de 1980 (acho que 1982, mas não lembro direito) ganhei tudo (melhor jogador, revelação, artilheiro do torneio inicio, artilheiro do campeonato, gol mais bonito). Fui direto para a seleção do clube e depois chamado para treinar nos times profissionais (ainda no juvenil) do Botafogo de Salvador e no Redenção. Me achava craque, mas tive a real dimensão do futebol brasileiro (só tem craques!), quando fui treinar no Botafogo e vi que, como eu ou melhor, havia uma dezena. Joguei muito também em um clube na Barra da Tijuca, o Nevada, no Rio, que íamos, a família, todo fim de semana. Era moleque de 11, 12 anos e já jogava entre os adultos.

Depois, na seleção do Baiano de Tênis, treinei e joguei, mas a violência me tirou do futebol. Depois de inúmeras entradas violentas, rompi os meniscos e ligamentos do joelho esquerdo. Operei e nunca mais voltei a jogar como antes. Lembro que na década de 1980 a cirurgia era outra, com grandes cortes e abertura do joelho. Voltei recentemente ao médico que me operou e ele, ao ver as cicatrizes no meu joelho, disse que se alguém fizesse isso hoje, iria preso! Resolvi então deixar pra lá o futebol, que ia estudar. Larguei a bola e fui para os livros. Há uma mudança foi também social, não apenas médica. Sai do círculo dos “Mauricinhos violentos, machistas e superficiais” dos clubes da elite soteropolitana (nem todos os que jogavam comigo eram assim, claro, mas alguns com quem jogava faziam parte da gangue dos estupradores da Barra, como ficaram conhecidos na imprensa local, uns foram presos e o líder, que morava no meu prédio, morto na prisão) e comecei a circular por um meio mais “alternativo e intelectualizado”. Fui me afastando aos poucos do futebol, tanto na prática como no acompanhamento das notícias. A década de 1986 foi o marco, quando abandonei o futebol, fui para o mestrado e descobri o Tai Chi Chuan (e tivemos a decepção de 1986, também, quando estava já morando de novo no Rio de Janeiro). E assim foi até o meu retorno ao país em 1996 (embora tenha jogado na França e acompanhado a copa de 1994). Só voltei a me interessar por futebol nos anos 2000. Mesmo o Fluminense eu abandonei neste período.

Agora acompanho os jogos, assisto a todos do Fluzão e voltei a me emocionar com o futebol, “apesar de vocês”, FIFA e CBF.