Mobility, ICA 2008

Mobility, ICA 2008

Participei na tera e quarta passadas da pr-conferncia “The Global and Globalizing Dimensions of Mobile Communication: Developing or Developed?” no ICA, aqui em Montreal.

Tera-Feira, dia 21

O evento foi de alto nvel centrado em diversos aspectos do uso do telefone celular. Muitos dados e poucos vos tericos, mas interessante para ter uma viso geral dos estudos e para conhecer melhor as micro e macro relaes sociais com o uso do celular.


James Katz, keynote da Pre-Conf

Os palestrantes mostravam suas pesquisas de terreno, os dados coletados e as anlises gerais. Nada surpreendente mas olhares locais que ajudam a ter uma viso global dos diversos usos do telefone celular: mulheres e patriarcalismo, mercados na ndia, circulo intimo e reforo identitrio, circulao financeira, design e educao…Fui dado um panorama dos usos do celular em vrios pases. As palestras praticamente no abordaram as experincias com as “locative media”, arte ou games, o seja os “location-based services”. A discusso sobre o espao urbano perifrica.

A abertura foi com uma palestra, genrica, de James Katz. O ttulo prometia algo ligado a cognio, mas esse foi apenas tangencialmente tocado. Katz mostrou o celular como um objeto “naturalizado” (ele no usou esse termo), expondo fotos dos mais diversos momento do aparelho na vida quotidiana. Mostrou o celular como artefato cultural ( produzido por e produz novos hbitos, crenas e costumes). Apresentou tambm algumas vantagens e desvantagens do dispositivo, sempre com dados mundiais. Segundo Katz, h hoje uma grande dependncia : 51 por cento das pessoas dizem no poder viver sem um celular, criando o que ele chamou de nomophobia ou no mobile phone phobia. E isso muito presente no uso que os jovem fazem. Sem o celular eles se sentem fora da vida social. Alm disso, se voc no tem um celular, voc torna-se um problema para as outras pessoas.

Depois as comunicaes.

Kas Kalba mostrou a penetrao do telefone celular no mundo e sugeriu como hiptese uma correlao climtica. O desenvolvimento comeou nos pases frios e estaria migrando para os pases quente. Explicou a penetrao da telefonia mvel na Itlia pelo pioneirismo no uso de “pay-payed phone”. As correlaes so difceis. Mxico e Brasil tm menos celulares que Rssia e Estnia, embora os pases latinos tenham uma PIB maior que os nrdicos.

Depois Rivka Ribak, apresentou os resultados de suas pesquisa com mulheres, adolescentes, no oriente mdio. O uso de celular ;e universal mas afetado pela cultura. O global negocia com o local. Com prticas patriarcais, cria-se diferentes prticas de adoo e resistncia do uso por adolescentes na Palestina. Ela realizou uma etnografia entre 2003 e 2005 com gartoras de 16 a 18 anos. Apresentou questes como: que idade aceitvel para dar um celular para meninas? O marido pode acessar o celular da mulher, e vice-versa? Como concluso apontou para os antagonismos presentes na adoo do celular na Palestina. A tenso se d entre tradicionalismo e progresso; protecionismo e liberalismo…

Dana Diminescu se interessa pelo fluxo financeiro e os migrantes e como a telefonia mvel age nesse contexto. A pesquisa busca entender como os migrantes desenvolvem suas relaes com a mobilidade: a conectividade e o controle. Centrou a discusso na relao entre migrantes e transferncia bancria, mostrando criticamente a relao entre os “mobile operators” e as “credit card companies” (atingem hoje 200 milhes de trabalhadores). Analisou pases como Filipinas, Qunia, ndia, Frana. No entanto, o conceito mais interessante apresentado foi habitle, proposto por Dominique Boullier. Habitle a concrete form of connectivity. It refers to all the underpinning of our feeling of belonging – city, national, bank, social networks). Para Boullier,

“L’habitle dsigne ainsi ces dispositifs portables chargs d’information qui nous maintiennent en lien avec nos mondes d’appartenance et qui ‘tendent notre bulle’ (E. Goffman) au-del de l’espace de co-prsence. Les objets deviennent alors une part de nous-mmes, ils deviennent en cela trs singuliers, car deux portables identiques la production ne le restent gure ds qu’ils sont entre les mains de deux utilisateurs, d’autant plus facilement que le numrique les rend plastiques, transformables, paramtrables en fonction de la personne.” Ou seja, tudo que diz respeito a acesso e pertencimento a um territrio informacional: senhas, cdigos e poder em forma de bits e bytes. Habitle como uma “segunda pele”, um novo territrio, um “territrio informacional”, uma zona de acesso informacional controlada.

J Katie Lever apresentou sua pesquisa com estudantes secundaristas nos EUA para saber como eles usam o iPod, como eles consomem “mobile music”. Criou um grupo focal com 43 estudantes e analisou 200 questionrios na primavera de 2007. Buscou responder perguntas como: o que motiva ter um MP3 player? onde e quando usa? sentem-se isolados?…etc. A questo da pesquisa se os MP3 player causam isolamento ou, ao contrrio, criam “community building”. H hoje 90 milhes de usurios de iPod. Citou autores que abordaram o tema com Bull (pblico e privado), Coyne (situao, no-lugar) , Gergen (“absence presence theory”), Garfinkel, 1967 (social control controle sobre o ambiente). Para ela, a idia de um soudtrack for life remete ao “non-place”. A idia que, j que me isolo e crio o meu som, estaria produzindo um “nao-lugar”. No entanto, como mostrei em outro post, podemos pensar que o usurio apenas cria uma modulao do lugar (o som). Mudando o som, muda-se a relao com o lugar. Concluso: os jovens usam os players para mudar de humor, escapar de constrangimentos e criar outra relao com o espao e o tempo.

Quarta feira, dia 22

Andrea Kavanaugh, Virginia Tech, HCI, explorou a relao entre o uso do celular e os iletrados. Apontou o celular como “scaffolding technology” (scaffolding : abrigo para trabalhadores) e mostrou problemas e idias para o design dos aparelhos. Entrou em algumas particularidades e citou o jitterbug cellphone (telefones com apenas o pad com nmeros, on-off e 911) como sendo til para pessoas analfabetas. Em comparao entre o telefone fixo, celular e computer, o celular um computador (“screen, files, save, pictures, audio…”).

Depois, Dawna Ballard, dos “communication studies” da Universidade do Texas, apresentou sua pesquisa sobre temporalidade, aqui compreendida como as relaes pragmticas como a conexo, a conectividade, o tempo de uso, a hiperconexo (usar sem parar SMS, e-mail, blogs, facebook, twitter…). Em estudo com 2400 pessoas e 17 pases mostrou que quase 17% das pessoas so hoje hiperconectadas. A relao com o celular implicaria novos padres globais e locais do tempo (temporalidade pensada como freqncia de uso). Noes como perpetual contact (Katz, et al), space of flows (Castells), network time (Hassan, 2007), presence-absence (Fortunati), entre outros perpassa a pesquisa. H particularismos culturais. Citou tambm a inter-relao entre microblogging e co-presena, dando o exemplo um evento onde os organizadores mudaram a dinmica depois de discusses no Twitter, mesmo estando todos no mesmo lugar.

Gwen Shaffer da Temple University, Philadelphia, analisou o sistema de acesso a rede “peer to peer” e apontou como este pode ajudar a diminuir o “digital divide”. O enquadramento da discusso se deu em termos de economia poltica, esfera pblica e mobilizao social. A soluo apontada, depois de fracassos no MetroFi, Earthlink, etc, em sistemas peer to peer com mesh e ad hoc networking. H problemas de modelos de negcios e os sistemas abertos parecem ser uma alternativa. 54% dos usurios dizem usar conexo de outros. Citou exemplos de mesh como Meraki, Fon, Whiser, j mostradas nesse Carnet e tambm experincias com as “community networks” como Upsi, Seattle Wireless, Juneau Wireless…entre outras, ou ainda as europias FunkFeuer, Guifi.net, Athens Wireless, Metropolitan Network, czfree.cz…, usando open source software. Os obstculos so as ISPs, a regulao Federal e o medo em relao segurana e privacidade.

Timo Saari, tambm da Temple University, discutiu o uso social e o espao pblico. Como temos mostrado aqui, a “ubiquitous computing” rene processamento de informao, redes sem fio, sensores e dispositivos mveis, “integrated into everyday objects and activities”. Aqui o termo sinnimo de “pervasive computing”. Citou o trabalho de Hiroshi Ishii e sua idia de “ambient media”, com zonas de fachada e de fundo (foreground x background). -> Goffman gestalt. Mostrou vrios exemplos em que o contexto (o lugar) conta: orientation/ multitasking/ mobilidade, criando o que ele chamou de “psychological sphere”! A pergunta que sua pesquisa tentou responder foi: “what is the effect of context on our use of cellphones?” No meu caso, a questo a mesma mas invertida: “how te context change with the use of cellphone (microrelacao social, novas funes para antigos lugares, novas funes para novos lugares…), ou seja, como o uso do celular muda a relao com o contexto! Ele chama de “social media” (haveria alguma mdia que no fosse social?) o que prefiro chamar de mdias de funo ps-massiva (myscape, facebook, microblogs…). Afirmou que o futuro “location embedded/physical embedded” e que estaramos ainda na era da “ubiqutous computing”, caminhando para o “embedded universe”.

Scott Campbell da University of Michigan discutiu a relao entre “mobile communication and public space”, interessado nas relaes entre as tecnologias mveis e o engajamento cvico e poltico. Mostrou que h duas formas gerais de relao com o espao pblico: uma informal domstica, pessoal, e uma outra formal, poltica e cvica, como as diversas manifestaes conhecidas como “smart mobs”. Citou Castells, Rheingold e Putnam, mostrando o declnio do capital social nos EUA. Sua pesquisa est centrada nos usos: “information exchange / sociability / recreation”. Afirmou que os estudos anteriores da internet estavam centrados em questes como “isolation, alienation, less face to face”. No entanto, ele afirma que h, diz sua pesquisa, formas de “community building”, “informal socializing” que reforam o capital social e que esse uso informal importante para um uso mais formal das tecnologias. Segundo afirma, a tendncia haver um aumento do engajamento civil e da participao poltica.


Rich Ling

Rich Ling mostrou sua pesquisa sobre o uso do celular em crculos ntimos se perguntando se o dispositivo refora ou no as relaes mais ntimas. Ling fez uma pesquisa sobre a situao na Noruega e na Ucrnia com 2325 questionrios respondidos na Noruega e 1028 na Ucrnia. Na Noruega a situao de uma maior penetrao e uso de SMS: todos tem celular. Na Ucrnia, apenas os mais jovens. A Ucrnia usa mais voz que SMS, depois e-mail e IM. Na Noruega o celular tem forte penetrao entre os teens sendo o uso de SMS bastante difundido. E-mail pouco usado (sendo considerada uma ferramenta para “velhos”. Ling apresentou vrios dados e na concluso afirmou que os celulares suportam interao no “intimate space”, que os servios avanados (Web, IM, Micro-Blogging, etc) “have only limited acceptance”.

Jonathan Donner, da Microsoft Research ndia, mostrou uma tipologia do uso dos celulares na ndia para o comrcio informal. Os celulares ajudam a reduzem custos, permitem uma comunicao de proximidade e informal com clientes e fornecedores, que ele facilita as “trust-based relationships”, aumenta a produtividade e que eles seriam vitais “not for make but for getting money”. Citou exemplos sobre o mercado de peixes na ndia. O celular serve aqui para: “serve costumers, get price information, coordinate with trusted partners, serving existing customers, acquire new constumers, bypass middleman, start new business”. Seria tambm uma forma de substituio dos telefones fixos. O mote micro-coordenao e mobilidade, afirmou (fishemen, taxidiver, roaming traders). A aplicao mais usada a voz. O celular potencializa os negcios j existentes, ao invs de transform-los completamente. Da mesma forma, Harsah de Silva, mostrou os benefcios econmicos do acesso telefonia mvel na ndia, no Paquisto, no Sri Lanka, Filipinas e Tailndia.

Por ltimo, Rich Ling apresentou o trabalho de Helmersen, da Telenor, sobre a prtica dos “miss calls”, ou seja o uso do celular como cdigo sem pagar a comunicao: uma pessoa liga e desliga antes da outra atender, deixando o numero registrado e, consequentemente uma mensagem: “quando eu ligar, isso significa que j cheguei no lugar do encontro. Segundo a pesquisa h problemas de congestionamento (?) do trfico na rede e no h lucro para as empresas (?). Segundo a pesquisa, 2/3 do trfico so de “miss calls”. A pesquisa desfaz tambm alguns mitos: 1. que apenas as pessoas com poucos recursos fazem esse tipo de ligao; 2. que a motivao apenas econmica, mostrando que isso faz parte do “teens entretainment”Interessante sobre aspecto das relaes com o celular ainda pouco estudado.

Na soma, o evento foi bom para conhecimento de prticas embora tenha sentido falta de teorias mais complexas que no sejam apenas derivadas da anlise dos dados coletados.