Entrevista Wall Street Journal

ninja_congresso

Coloco aqui na ntegra, em portugus, a minha entrevista com a jornalista Loretta Chao, do WSJ. A matria, “Independent ‘Ninja’ Journalists Gain Some Traction, Helped by Facebook”, est no site para assinantes: Brazil Protests Prompts Shift in Media Landscape. S uma pequena parte do que foi discutido abaixo est no texto, da o interesse em publica-lo aqui.

1. What are the biggest differences that social media made in the current wave of protests in Brazil, from previous mobilizations such as in 1992?

Em 1992 o objetivo era claro: o impeachement do presidente Collor. No havia internet e a relao era com os meios de massa. Na eleio de Collor, a Globo apoiou o ento candidato. Depois, denuncias da revista Veja mostraram a corrupo do governo. A Globo passava a minissrie Anos Rebeldes, mostrando jovens lutando contra a ditadura. Os caras-pintadas foram para as ruas usando slogans da minissrie. Isso bem diferente do que temos hoje. Eu, por exemplo, estava na Frana nesse perodo (1991-1996) e tinha pouqussimas informaes. Soube da queda do presidente quando sa um dia de manh e me deparei nas bancas com uma foto do jornal Libration mostrando, na capa, uma jovem cara-pintada com a legenda caiu o presidente do Brasil. Hoje, no s acompanharia em tempo real os eventos, como poderia tambm participar.

2. What effect do you think social media has had on governments of emerging countries around the world?

As mdias e redes sociais so instrumentos de conversao e de trocas abertas de informaes. Elas servem para fazer circular aquilo que os governos tentam esconder, ou aquilo que a grande mdia no informa por interesses particulares. Elas ainda so novidade para muitos governos. Eles no entendem a importncia dessa nova esfera conversacional entre os jovens. Pensam na internet como algo distante, como uma promessa ainda utpica, como um virtual fora do mundo real. Esto redondamente enganados. Mas essa situao est mudando aos poucos. No Brasil, nesse momento, a participao dos governantes nas redes sociais pfia. Comeam a monitorar, no para escutar demandas sociais e agir politicamente, mas para antecipar aes de represso (recente noticia fala de um Prism brasileiro com a vigilncia da ABIN). Mas, mesmo lentamente, os governantes comeam a percebem como as mdias e redes sociais fazem parte do quotidiano e que elas so polticas. As pessoas esto falando dos problemas das suas cidades. Os slogans, e mesmo a forma de escrev-los, com “hashtags”, nas ruas, so os mesmos que encontramos no Twitter e no Facebook. Parece que os governantes comeam a perceber que no h separao entre as redes sociais e as ruas, entre o virtual e o real. Mais ainda, essas redes potencializam as ruas.

3. Do you think independent journalists such as NINJA and POSTV played a major role in the protests? How so?

No sei se tm um papel maior, mas desempenham uma funo muito importante, sem sombra de dvidas. mais um exemplo dessa esfera conversacional. As informaes e as articulaes se do pelas redes sociais. Esses jornalistas independentes, na maioria dos casos com imagens e sons toscos, pegam depoimentos da rua, em tempo real, de pessoas diversas. So testemunhos do que est acontecendo. A mdia mainstream no tem como competir com esse tipo de informao viva, no rs do cho! como se a grande mdia estivesse falando para um publico genrico, fantasma (the phantom public, Lippmann). Iniciativas como Postv e Ninja se dirigem para as pessoas que esto ou se interessam pelo o que acontece realmente nas ruas.

4. How have these protests affected the public perception of mainstream media? What was the perception before and what is it now?

A percepo social, antes e agora, , de uma maneira geral, de que as mdias defendem os seus interesses e que temos que desconfiar. Nas atuais manifestaes, a mudana do discurso das principais emissoras de TV (primeiro falando de manifestao de vndalos, violenta, para logo depois descrev-las como pacfica, sendo maculada pela ao criminosa de uma minoria) e o apoio das mdias impressas mais conservadoras, reforam essa percepo, mostrando como o “mainstream” flutua de acordo com seus interesses. A fora das mdias sociais e dos excessos da fora policial foram importantes para essa mudana. As pessoas compreendem melhor o descompasso dos mass media. As mdias sociais esto acopladas s dinmicas das ruas.

5. How do you think the movements would have developed without the recent surge in use in Brazil of Internet and social media?

Acho que, provavelmente, eles no teriam essa extenso ou no ocorreriam. Mais de 80% dos participantes se informaram e se articularam pelas redes sociais.Os temas das reivindicaes so pulverizados e no poderia ser diferente. mesmo querer demais cobrar uniformidade das demandas ou uma razo poltica e comunicativa nesse momento. O que estamos assistindo uma extenso das redes sociais, onde se fala de tudo. No h o virtual e o real. Os movimentos sociais que se produzem agora no Brasil mostram como as redes esto acopladas s ruas e as ruas s redes sociais. O slogan usado Sa do Facebook apenas simblico. Ele no expressa a realidade ou uma crtica internet. Se sarem do Facebook, ou do Twitter, as manifestaes cessam. O que esto dizendo : use o Face, mas venha para a rua. E os manifestantes esto fazendo isso. Os que participam dessas manifestaes so politizados, mesmo que 90% no faam parte de nenhum partido poltico. a insatisfao, bem como a crise de representatividade, criadas pelo crescimento econmico do pas, pela desigualdade social e pelos privilgios da classe poltica brasileira. Acho esse movimento mais prximo dos indignados da Espanha do que da primavera rabe. Mas no uma manifestao do Twitter ou do Facebook, mas tambm no uma manifestao sem Twitter ou sem Facebook. No podemos mais pensar em democracia sem as redes sociais e a internet. preciso implantar, junto a mecanismos de democracia representativa, mecanismos de democracia direta e participativa que estejam sintonizados com as ferramentas das redes sociais.