No aeroporto internacional do Rio de Janeiro…

RIO-BAHIA-CEARÁ

Acorda às 4:30 da manhã, corre para pegar o avião das sete e depois de duas horas voando chega ao Rio de Janeiro. Trabalho, trabalho, trabalho. Uma banca de mestrado e depois de alguns chopps, sentindo-se meio inútil e sem sentido, entra no táxi para uma reviravolta.

Fala ao taxista:

– é bizarro o avião. As 7 da manhã estava em outra cidade e agora estou aqui, no mesmo dia, voltando para a cidade de origem.

E o simpático taxista de 52 anos, chamado Péricles, começa a contar a história que vem a dar sentido a esse dia. Pergunta-se mesmo se a viagem, corrida, cansativa e estressante, não teria sido só para esse trajeto pela perigosa linha-vermelha em direção ao aeroporto.

E o taxista começa:

– sou engenheiro de formação e abandonei tudo por um sonho. Quando criança, com 5 anos ia sempre ao Ceará, terra dos meus pais e um dia, viajando por estradas de barro em caminhão (o asfalto só ia até Feira de Santana), vivi várias experiências, batidas, comidas podres, falta de freio que fez o caminhão cair no rio…enfim, chegava ao Ceará e ficava feliz, em paz, me sentindo em casa com meus numerosos primos. Um dia fiz uma promessa. Voltando do Ceará ao Rio, com 5 anos de idade (ainda me lembro com se fosse agora) estávamos viajando e vi a placa: Rio a tantos quilômetros. Olhando pela janela como olho esse carro que está passando aqui agora, vi um caminhão que passava em sentido contrário. Pensei e comecei a chorar: queria sair do carro, pular no caminhão e voltar para o meu lugar da felicidade. Nesse dia fiz um voto que iria me tornar caminhoneiro e viajar todo o Brasil. Me formei em engenharia, juntei dinheiro comprei um caminhão e virei caminhoneiro por 15 anos. Tive 6 mulheres e tenho 3 filhos. Hoje me sonho é ver meus filhos pequenos crescer e depois desaparecer…tive seis meses de depressão mas agora estou bem com minha atual mulher, mas às vezes tenho vontade de morrer.

E ele pensava que também tinha sido engenheiro, que tinha abandonado tudo por outro sonho, que ia e vinha pela Br 116 com pai, mãe e irmãs do Rio à Salvador todos os anos e que adorava estar com os primos, ver a família junta já que os pais nunca foram unidos e aquele era o melhor momento da vida: pai, mãe e duas irmãs vivendo a vida em plenitude (ou assim achava que era) indo do Rio à Salvador. Sempre que voltava de Salvador, tinha a sensação que a felicidade havia acabado e que o dia a dia do Rio iria reestabelecer a disputa dos pais, a monotonia da escola e as brincadeiras e pirraças com as queridas irmãs. Entendeu então que a vida é assim, coleção de sonhos e desesperos e que aquela viagem não tinha sido para avaliar dissertações, conversar sobre associações mas sim para encontrar o taxista-engenheiro Péricles que tinha trocado tudo pelo sonho de caminhonar pelo Brasil.

Seus olhos encheram-se de lágrimas e, sem perceber, estava tirando os 40 reais do bolso, pagando e apertando a mão do condutor desejando-lhe a felicidade em 2004. Entrou no avião e fez mais uma vez, de forma solitária, a viagem do Rio à Salvador.