Salvador and Locative Media
Trabalhos apresentados por alunos da disciplina Mídia Locativa, disciplina optativa da Faculdade de Comunicação da UFBa, revelam diversas facetas da cidade do Salvador. Os projetos foram realizados por equipes como trabalho final para avaliação final da disciplina. Há além do projeto realizado no espaço urbano, uma monografia como uma espécie de memória técnica dos mesmos. Os alunos usaram alguns equipamentos e conceitos discutidos durante a disciplina. Os principais equipamentos utilizados foram: GPS Tracker, Celulares, Mapas Digitais, Câmeras fotográficas e de Vídeos. Os conceitos chaves foram: mídia locatuva, localização, lugar, espaço público, mobilidade, comunicação. Como pode ser visto abaixo, e no blog citado acima com mais detalhes, os projetos visam revelar aspectos artísticos, sociais, políticos e ambientais do espaço urbano da capital baiana. Vejamos:
O projeto QR Code em banheiro faz dos QR Codes um espécie de graffite eletrônico, virtual, em meio às diversas escritas encontradas em banheiros públicos pela cidade. Segundo os autores o objetivo foi propor uma experiência artíticas desses códigos usados comumente para substituir os códigos de barra em produtos. O trabalho recente de Giselle Beiguelman, Suite for Mobile Tag, parte do mesmo princípio. Vejam o que dizem os autores:
“uma espécie de utilização lúdica dos códigos, interagindo com um meio coletivo em que, usualmente, passa-se sem notar detalhes. Pode-se, ainda, entendê-lo como uma metáfora das pichações físicas, proporcionando reflexões num momento extremamente propício: o isolamento de uma cabine de sanitário. Locais em Salvador onde, até o momento, foram colados QR Codes em seus banheiros: Faculdade de Comunicação da UFBA, Salvador Shopping, Shopping Center Lapa, Shopping Piedade, Aeroporto Internacional Luís Eduardo Magalhães, Sala de Arte do Vale do Canela (PAC) e Biblioteca Central da UFBA.”
QR Code nos Banheiros
Em Os Caminhos da Notícia, o grupo de pesquisadores buscou mapear, com um GPS tracker e ferramentas de mapas digitais, o caminho de uma notícia (sobre cidadãos da terceira idade), desde a saída dos jornalistas da redação, até a chegada dos jornais em uma banca de jornal. O projeto é similar, em forma, aos projetos de Ester Polak, Amsterdam Real Time e Nomadic Milk. Segundo os autores do projeto:
“A idéia foi monitorar o movimento de uma cobertura jornalística, criando um traçado na cidade, para, de forma simbólica, registrar como a notícia se apropria do espaço urbano. Este mapeamento, como mostraremos adiante, se deu a partir do processo produtivo da notícia, desde sua apuração até a chegada ao leitor, passando pelas fases de edição e impressão. Acompanhamos uma equipe de reportagem do jornal A Tarde, destinada a cobrir uma pauta sobre crimes contra idosos. Na primeira parte do percurso fomos até a Delegacia Especial de Atendimento ao Idoso, para entrevista com a delegada. Apurada a reportagem, voltamos à base do A Tarde para acompanhar a parte de edição e diagramação. Depois seguimos para a gráfica, que fica dentro das instalações do jornal, para conferir a impressão. Por fim, acompanhamos o caminho do jornal impresso até uma banca de revista.”
Vila Brandão é um projeto que visa chamar a atenção da sociedade soteropolitana para a existência de uma comunidade, situada em área nobre da cidade, que é alvo, já há bastante tempo, da especulação imobiliária e das forças políticas e sociais que visam a sua estigmatização (como lugar perigoso) e a sua retirada da área que ocupam a décadas. O projeto visa questionar os processos de desapropriação e chamar a atenção da comunidade local ao redor (Graça, Vitória, Barra) que mal conhece a Vila. O grupo usou mapeamento, geotagging, QR Codes, fotos e vídeos para produzir informações locativas dando voz aos moradores. Segundo os autores:
“A partir deste quadro resolvemos investir no potencial politico das mídias locativas, para desenvolvermos um projeto de mapeamento e geotagging, que pudesse de alguma forma colaborar na denúncia dessas práticas arbitrárias, dando voz a quem não tem voz e fazendo visível a problemática desta comunidade. (…) Posteriormente, este conteúdo em vídeo, além de algumas fotos, foram anexados ao Quickmaps, a uma conta do Picassa e ao blog do projeto (todos disponíveis em rede). Além disto, foram espalhados QrCodes pelas áreas próximas a Vila Brandão (Barra, Corredor da Vitória, Graça), na tentativa de informar e sensibilizar os moradores que vivem nos arredores da Vila para a situação vivida por esta comunidade, que além de existir quer permanecer na aréa. O projeto Vila Brandão Existe, ainda que bem experimental, pretende ser uma plataforma colaborativa e aberta de trocas de informações, seguindo a filosofia da web 2.0, criando um espaço virtual participativo no qual os interessados podem produzir e disponibiliza conteúdos, criando uma banco de dados online sobre a Vila.”
Vila Brandão
O projeto Narrativas Passageiras visa questionar o fluxo de informação, a mobilidade e a visão do espaço urbano a partir de imagens e mapas feitos dentro dos meios de transporte público, aqui os ônibus, explorando com enquetes a usuários os deslicamentos quotidianos em uma linha da cidade. Sob a forma de reportagem de cunho etnográfico, o grupo documentou (em áudio, fotos e vídeo) diversas situações fora e dentro dos ônibus. Segundo os autores,
“Utilizando a premissa maior de mobilidade e informação, fizemos entrevistas dentro do próprio ônibus, tiramos fotos e gravamos o áudio das entrevistas. Após o processo de coleta de informações, mapeamos o trajeto através do quikmaps e adicionamos fotos a partir de uma conta criada no Flickr. Além disso, criamos um blog para publicação de nossa reportagem. A terceira etapa do processo constitui-se no espalhamento de QR Codes ao longo dos percursos feitos pelas duas linhas em questão, além de alguns pontos da Facom e do Campus de Ondina.”
Narrativas Passageiras
O projeto Memória de um Rio chama a atenção para uma questão ambiental, o trabalho de csontrução de uma área sobre o rio dos Seixos, na Av. Centenário em Salvador, considerado por ambientalistas um dos rios urbanos mais vivos da cidade. A obra tirou colocou o rio como um canal subterrâneo, sem contato com o ar ou o sol, matando assim a flora e a fauna que dava sinais de recuperação. O projeto, hedeiros de outros com a técnica do “GPS Writing/Drawing”, como os trabalhos de Jemery Wood, escreve a palavra Rio no parque construido acima do “soterrado” rio dos Seixos. Os membros da equipe documentaram a região com fotos e vídeos do espaço atual e do mesmo espaço antes da intervenção da prefeitura. Segundo os autores:
“O projeto Memória de um Rio tem como objetivo explorar o viés político das mídias locativas – em particular, o GPS – e utilizar as potencialidades da internet como elemento difusor de questionamentos. Propõe-se uma reflexão, de cunho social, político e ambiental, acerca da cobertura de cimento que foi posta sobre o rio dos Seixos, localizado na Avenida Centenário, no bairro da Barra em Salvador. Outra meta deste trabalho é manter viva a memória do rio dos Seixos entre a população baiana e alertar para a importância da preservação ambiental. Pretendemos também questionar o crescente processo de artificialização da cidade – que vai de encontro à tendência global de combate a destruição do meio ambiente – e as constantes transformações nas paisagens acarretadas pelas intervenções humanas na natureza. A cobertura do rio dos Seixos, que era um dos mais limpos do município e se encontrava em processo avançado de recuperação, representa mais um etapa na superposição das estruturas artificiais sobre a natureza.”
Memória de um Rio
Por último, o projeto Define a Sua Cidade, usou um texto em áudio do maldito poeta baiano do século XVII, Gregório de Matos, em QR Codes espalhados por pontos turísticos de Salvador. Ao clicar no QR Code em um desses pontos, o usuário é levado a ouvir o poema homônimo que questiona as belezas e a “alegria” da cidade. O objetivo é assim artístico e político, ao problematizar o lugar instituído pelos poderes públicos, principalmente pela indústria do turismo. O arquivo sonoro pode ser ouvido aqui. Segundo os autores:
“Para isso, ao fotografar com o celular o QR Code, automaticamente o usuário acessa um arquivo de áudio que contem uma gravação do poema Define a Sua Cidade, escrito no século XVII pelo primeiro grande poeta da Bahia: Gregório de Matos. O poema, que começa com os versos “De dous ff se compõe esta cidade a meu ver”, trata com escárnio uma Salvador cheia de problemas que, a nosso ver hoje e então, esconde suas mazelas debaixo do tapete e mostra ao mundo uma face que não é a sua.”
Defina Sua Cidade
Em todos os projetos vemos, efetivamente, como o uso crítico, político e artístico das mídias locativas podem criar formas de problematizar o espaço vivido, de dar visibilidade a problemas e dimensões (sociais, políticas, ambientais) escondidas, de criar novos sentidos do lugares.