Announcing a Child’s Death on Twitter
Gostaria de fazer um rápido comentário sobre o anúncio da morte do filho pela mãe no Twitter, reportado aqui no NYTimes.com. Este fato mostra, por um lado, o isolamento presencial e, por outro, a sociabilidade online crescentes na cultura contemporânea.
Normalmente comunicamos em redes sociais “online” (blogs, twitter, facebook, orkut, etc.) e “offline” (com amigos, familiares, colegas em diversos ambientes do dia a dia), com entusiasmo, momentos felizes e também, com pesar, momentos mais graves como doenças e perdas de entes queridos. Compartilhar faz parte dos ritos sociais e existem desde sempre e é esse compartilhamento que reforça os laços sociais. Quem usa o Twitter e blogs sabe como as pessoas anunciam boas novas e como elas se queixam das dificuldades do dia a dia. Mais raros, mas não inexistentes, são anúncio de momentos mais graves como doenças, mortes ou suicídio. Há alguns meses, no Brasil, a blogueira Ematoma, supostamente comunicava seu suicídio via Twitter (parece que não foi suicídio, e sim assassinato, mas os twitts pareciam escritos por quem estava realmente se despedindo). Vejam detalhes abaixo e aqui no link.
“Blogueira Ematoma se suicida e despede-se via Twitter – http://twitter.com/ematoma
“bai pipou! Foi bom brincar com vocês! bjo bjo”. Foi com essas palavras que a blogueira Marisa Toma, mais conhecida como @ematoma se despediu em seu Twitter, dona do blog Objetos de Desejo que discute moda e tendências, Marisa aparentava ser uma pessoa bem antenada e inteligente, as duas últimas mensagens deixadas em seu Twitter demonstram que a blogueira já devia estar planejando o suicídio:
– bai pipou! Foi bom brincar com vocês! bjo bjo
– tomando algumas decisões bastante definitivas”
Agora, Shellie Ross comunica, via Twitter, a morte do seu filho de 2 anos, afogado na piscina de sua casa. Rapidamente a notícia se espalhou pelo Twitter e nos blogs com mensagens de suporte e ajuda e outras acusando a mãe de negligência (se alguém posta em um momento desses é por que dá mais atenção ao Twitter do que ao filho, etc.). Não há evidências de que essas acusações levianas e perversas tenham qualquer fundamento. Notem na citação abaixo do NYT que a mãe lançou a notícia no Twitter 5 horas depois do acontecido (ela nao estava twitando quando ocorreu o fatou ou nao saiu no mesmo momento para colocar a notícia no blog e Twitter). Em outra matéria, do thetowntalk.com, a polícia afirma que o Twitter não teve nada a ver com a morte do menino.Parece ser mais uma incompreensão do meio e da potência afetiva e social das mídias pós-massivas, das redes sociais que dão alento e suporte emocional. Ross parece ser uma mãe dedicada e que usa blogs e Twitter como espaço de socialização.
Há quase exato um ano atrás, transmiti, pelo celular via Qik, o nascimento do meu segundo filho, Bernardo. Também recebi críticas e elogios. Hoje o vídeo está em privado. Não sei se compartilharia momentos de extrema tristeza. Mas não se trata aqui de julgar a mãe, que não conheço e não sei como tratava o filho ou como ela usa a internet. Os depoimentos nos levam a acreditar que Ross é uma mãe atenciosa. Talvez, se não fosse, não colocaria a notícia no Twitter e no Blog. O que está em jogo aqui é a força comunitária e de suporte afetivo das redes sociais como forma de amenizar o isolamento e a solidão cada vez maiores nos grandes centros urbanos.
Vejam aguns trechos da matéria do NYT escrita por Lisa Belkin:
“Shellie Ross, Bryson’s mother, is a popular blogger, who chronicles her life as a mother of four, and the wife of an Air Force sergeant, and whose Twitter account, @Military_Mom, has more than 5,400 followers.
She tweeted those followers at 5:22 p.m. Monday, with a breezy update about the fog rolling in and spooking the chickens as she worked in her chicken coop. Sixteen minutes later, a 911 call was placed from her home saying that Bryson was lying at the bottom of the pool. At 6:12 p.m. she tweeted again: ‘Please pray like never before, my 2 yr old fell in the pool.’ And five hours later, she wrote that she was ‘remembering my million dollar baby,’ posting photos of the little boy. (Some of these tweets and photos have since been removed.)
Not long after that, a firestorm erupted on Twitter, with strangers wondering what kind of mother tweets during a crisis. The debate has been going on for days around the Internet, with critics calling Ross callous (and suggesting that if she had been paying as much attention to her child as she had to her Twitter account, her son would not have come to harm) and supporters (many who know her in real life, and others who have never met her) describing her as a caring mother who reached out to her virtual community during a tragedy.(…)
McGraw’s Twitter account lists her hometown as being Bucks County, Pa., which is near Allentown.?? Asked by Florida Today if she thought it was appropriate to attack a woman she doesn’t know who just lost her son, McGraw responded: ‘If she didn’t want questions raised at such a painful time, perhaps she shouldn’t have tweeted immediately after her child died. A child is dead because (of) his mother’s infatuation with Twitter.’
Unlike McGraw, Shari Keating knows Ross and considers her a friend. They met via blog and social-networking conferences. (…) Keating called Ross a fantastic mother who is devoted to her children. Ross has two other sons, 18-year-old Cody and 11-year-old Kris. ‘To judge her, I think, is appalling,’ Keating said. ‘You have to realize that blogging is a community.’
Yes, it is. And it feels perfectly logical to me that Shellie Ross would reach out to that community with her pain. We all go through life supported by emotional scaffolding, a support system we don’t see until tragedy strikes, and then the veil lifts and it becomes fleetingly visible.
For so many of us, sometimes without realizing it, that scaffolding is shored up by people we have never seen, but with whom we communicate regularly. I would wager this is particularly true in the world of Mommy blogs, which were created by women precisely because they felt isolated in a new role.
Looked at through that lens, Ross’s tweets are not an example of the misuse of the Internet, but rather of its potential and power.(…)”
A internet e as redes sociais não isolam. O isolamento vendo sendo construído por séculos de uma modernidade individualista. Vemos a cada dia crescer formas de luta contra esse isolamento, formas de colocar em ação uma pulsão gregária, seja ela política, social ou pessoal. É para romper o isolamento, para tocar o outro, que as novas ferramentas de comunicação encontram o seu uso mais nobre. Informar, trabalhar, se entreter é fantástico, mas o mais importante e profundo é mesmo a possibilidade de instalar a conversação (ver post anterior), de romper o isolamento e de comunicar, essa ação em comum possível e improvável (Luhmann). Ross queria falar do seu momento de dor, buscava algum consolo e acolhimento afetivo para a sua dor entre os seus, próximos e distantes. Como sempre, colheu afagos e também agressões. É vida social, como ela é.
Absorvi nas suas aulas que os meios de comunicação digitais espelham o que somos na vida real. Vez ou outra me surpreendo com a transparência nas telas de computador que mostram o indivíduo para o bem ou para o mal, na dor dessa mãe e na crueldade de quem não a acolheu baseado em juizos de valor. Abs.
Virginia
Se na vida real transitamos por identidades distintas, acho que o mesmo ocorre com nossos perfis e ações no ambiente virtual. Um 'perfil' na plataforma lattes gera interações num âmbito diferente das de um perfil em sites de relacionamento. As variadas personas digitais de uma mesma pessoa (no twitter, num blog, como ouvinte, como autora de um canal do youtube, como acadêmica…) rompem o isolamento em esferas distintas, mas que podem ser inter-relacionadas com mais facilidade do que no mundo real.